O acaso levou-me a Munique, no último fim-de-semana. Uma cidade baseada em régua, esquadro e esfregona, tal a rectidão das suas linhas e a limpeza das suas ruas. Nos semáforos, um vermelho para os peões implicar parar, mesmo que o único carro visível esteja algures em Moscovo. Os papeis e outros dejectos – todos eles – são para colocar nos caixotes de lixo. As pessoas circulam na rua com a calma aparentemente apática que uma ordem desta dimensão proporciona (ou força).
Com um enquadramento assim, o futebol alemão, e particularmente o da Baviera (fonte principal do seu extinto fulgor), só poderia ser assim mesmo: recto, eficaz, organizado e bonito.
Com um enquadramento assim, o futebol alemão, e particularmente o da Baviera (fonte principal do seu extinto fulgor), só poderia ser assim mesmo: recto, eficaz, organizado e bonito.
Somos crias do meio ambiente em que crescemos, o que não espantará ninguém, e jogamos o futebol de acordo também com essa fatalidade: o futebol brasileiro tem uma alegria indolente, o dos argentinos a arte combinada com a faca na liga, o dos ingleses um orgulho inconsequente, e umas boas dezenas de bons exemplos apresentaria aqui, se a hora da escrita fosse outra, para comprovar esta regra.
Mas a maldita da excepção também borra esta regra. O que dizer do pedaço de terra que nos deu Dante, Pratt, Antonioni, Fellini, Botticelli, Da Vinci, Rossini, Verdi, a Ferrari, a pasta e o mais próximo que existe de uma prova da existência de um deus – afinal, acolhem o epicentro católico – com os milagres sob a forma de mulheres de Loren, Cardinale e Belucci?
O futebol italiano teria de ser belo, emotivo, raivoso, desesperado e permanentemente coberto de um pano negro de tragédia.
Mas não: a beleza é desprezada, a emoção é contida, a raiva é inexistente, o desespero é raro ,e a tragédia invade, invariavelmente, os outros.
Darwin não explicou esta.
Do Nápoles, seguindo a regra, esperar-se-ia algo de Camorra. Um destempero, um laivo de sangue nos olhos, uma agressividade latente. Mas não: o Nápoles é uma equipa absolutamente italiana. No seu acantonamento, transformando a sua área num Álamo, e no seu ataque sniper, preparado para liquidar, furtivamente, os seus adversários.
Mas a maldita da excepção também borra esta regra. O que dizer do pedaço de terra que nos deu Dante, Pratt, Antonioni, Fellini, Botticelli, Da Vinci, Rossini, Verdi, a Ferrari, a pasta e o mais próximo que existe de uma prova da existência de um deus – afinal, acolhem o epicentro católico – com os milagres sob a forma de mulheres de Loren, Cardinale e Belucci?
O futebol italiano teria de ser belo, emotivo, raivoso, desesperado e permanentemente coberto de um pano negro de tragédia.
Mas não: a beleza é desprezada, a emoção é contida, a raiva é inexistente, o desespero é raro ,e a tragédia invade, invariavelmente, os outros.
Darwin não explicou esta.
Do Nápoles, seguindo a regra, esperar-se-ia algo de Camorra. Um destempero, um laivo de sangue nos olhos, uma agressividade latente. Mas não: o Nápoles é uma equipa absolutamente italiana. No seu acantonamento, transformando a sua área num Álamo, e no seu ataque sniper, preparado para liquidar, furtivamente, os seus adversários.
O SLB da 1.ª parte foi longo e largo, controlado e preciso, entusiasmado – e, por vezes, entusiasmante – e decidido, mas improfícuo. Uma personagem de ópera, poderia adivinhar-se, trespassado mortalmente entre trinados de dor no último acto. E a adivinha teve quase aderência à realidade, quando, com o intervalo à ilharga, um jogador de azul teve tudo – menos o talento – para focar o SLB apenas nas competições indígenas.
Na 2.ª parte, o Nápoles começou a sair do Álamo. O SLB perdia tino. Mas também os nossos lads, embora oriundos de vários cantos do mundo, fazem aquilo que vêem em Portugal fazer. E o Katsouranis lá desenrascou um passe para um Reyes que atinou com os remates daquele lado.
Os italianos, empurrados para a frente pelo resultado, quais escorpiões, não conseguiram fugir à sua natureza. Continuaram com três centrais, na expectativa do erro alheio, refugiados e a tentar explorar o espaço que o SLB já não dava.
O dois a zero foi o carimbo de uma vitória histórica: a primeira eliminação de uma equipa italiana em mais de 20 anos. E – wishful thinking – o princípio de uma mutação do SLB: uma equipa que consegue ganhar aos contra-natura italianos.
SLB – 2, Nápoles – 0
2 comentários:
De vez em quando temos de «let go». Eu sei que em todos nós gente séria (ler: benfiquistas) o medo e o desespero se anicharam nos corações, construíram um pequeno condomínio e procriaram os seus esbirrinhos. Ganharam a nossa afeição. Com a excepção de um ou outro episódio desirmanado (até o campeonato foi ganho borrados de medo e em desespero), esta tem sido a realidade dos últimos 14 anos. Mas já não mais. Temos de os deixar partir, seguir a sua vida e encontrar verdes campos onde germinarem. Podem até ficar perto (a uns 2km), só para não nos esquecermos deles.
Eu, por mim, só peço que o Benfica jogue sempre para ganhar, que o adversário se sinta intimidado, não quero que o Benfica esteja na Luz a ganhar 1-0 ao Lixa e se ponha à defesa, como fazia com todos os Nandos que passaram pelo banco benfiquista. Foi por isso que ontem não pude deixar de lacrimejar, comovido, ao ver os jogadores do Benfica pressionarem os adversários no seu próprio meio-campo, a cinco minutos do fim e já a ganhar 2-0.
O Benfica pode até não ganhar nada este ano, mas se jogar sempre para ganhar, se tentar sempre jogar bem, eu fico satisfeito. Há anos que jogamos mal e a medo e continuamos a perder. Pior que o 6º não nos acontece.
"Foi por isso que ontem não pude deixar de lacrimejar, comovido, ao ver os jogadores do Benfica pressionarem os adversários no seu próprio meio-campo, a cinco minutos do fim e já a ganhar 2-0."
Eu também lacrimejei, radagast, eu também.
Enviar um comentário