4.12.07

Uma vitória infantil

O lado infantil dos adultos merece aclamações, sonetos, refrões, prosas, pinturas quando não hossanas. Desde a rebeldia infantil de James Dean até à visão de criança de Spielberg, passando pelo erotismo lactente de Dali, ser miúdo é uma bênção em qualquer actividade que possa merecer o epíteto de arte.
Mas não no futebol. No futebol ser criança é pecado. "Infantil" é insulto e precede sempre o "erro". A intensidade desta forma socialmente aceite de pedofobia é de tal ordem, que os jogadores mais jovens são apenas dignos de elogios quando lhes são reconhecidos sinais de maturidade.
O que é considerado como uma bênção para qualquer arte, não pode encontrar excepção no futebol. E, obviamente, não encontra.
O abençoado Benfica 2007 é um conjunto de crianças que poderiam trocar um campo de futebol por um parque infantil sem qualquer esforço de adaptação. As correrias frenéticas de Nélson, os dribles excessivos de Di María, a desfaçatez das finalizações de Cardozo ou o egoísmo de Rui Costa, podem ver-se em qualquer brincadeira de qualquer pátio de qualquer escola primária.

E foi com correrias frenéticas, dribles excessivos e finalizações com desfaçatez que o Benfica ganhou em Donetsk (ou "Dounéte", na versão Pedro Gomes da TSF).

Ao ver os jogos deste Benfica, o Obrigadosápinto sente-se como um pai da Opus Dei, vendo os seus 11 filhos a brincar num qualquer jardim. "Não corras para longe, Nelson!"; "Empresta a bola aos outros meninos, Rui"; "Não empurres a menina, David."
E, apesar do cansaço provocado pelos constantes alertas, aflora um sorriso paternal na nossa face. Porque ser pai, mesmo de miúdos tão mal comportados, acaba sempre por ser recompensador.

(Shakhtar Donetsk, 1 – SLB, 2)

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