10.1.10

O fim do longo 7 a 1

Tornei-me sócio do SLB aos 13 anos. Mas só me tornei verdadeiramente benfiquista mais tarde. Na altura em que recebi - com inesquecível emoção, é verdade - o cartão em casa, tudo era luz: goleadas, dobradinhas, bicampeonatos e até uma final europeia. Era, por isso, fácil ser do SLB.

Até que veio o primeiro e último Sporting-SLB que verei in loco na vida, o de 14 de Dezembro de 1986. Foi nesse dia que sofri a minha maior humilhação. E não foi por ter perdido por sete, nem tão pouco por ter ido de autocarro para Algés rodeado de lagartos que gritaram, incessantemente, "festival". Não. Foi por ter visto tipos que alegadamente eram do meu clube, a queimar cachecóis e bandeiras encarnadas. Ainda hoje tenho vontade de entregar um requerimento na Assembleia da República para identificar esses bandalhos e confrontar esses agora quarentões com aquele acto infame. Só de pensar que essa gentalha deverá ter filhos e os estará a "educar", fico ainda mais preocupado com o futuro deste país.
Mas adiante: essa humilhação fez-me sentir uma estranha fé. A fé de que iríamos ultrapassar, rapidamente e em grande, aquele conjunto de situações historicamente negativas.
No jogo seguinte, uma vitória confrangedora com o Braga. Mas a fé manteve-se para o jogo seguinte: com o Porto. E um Porto que iria ser campeão europeu nessa época. Tinha Futre - e para quem não saiba ou o queira ignorar, o melhor jogador português de todos os tempos depois de Eusébio - André - um jogador extraordinário - o Madjer, o Gomes, e mais uns quantos. Ah, e os árbitros, em força.

O SLB, para esse jogo, contou com os inenarráveis Edmundo e Wando, o tosco e inexperiente Tueba, um Shéu já em ritmo de reforma, o verdadeiro lento Dito, enfim, uma equipa que só tinha talento na cabeça de Rui Águas e nos pés preguiçosos do Diamantino.
Na Luz a transbordar, sentia-se essa mística, o sentimento que os rapazes, maioritariamente limitados naquilo que se traduz objectivamente em jogar à bola, iriam abusar da transpiração e ganhar. E no final desse jogo, compreendi, pela primeira vez, o significado de jogar à Benfica. Tivemos os Tuebas, os Nunes e os Edmundos deste mundo a jogar como se lhes tivessem raptado a familia, um Diamantino que decidiu, nesse dia, jogar à bola, e o Rui a recordar o que o pai lhe tinha ensinado na praia.

Superação, Orgulho, Coragem, Dedicação, Transpiração: jogar à Benfica, portanto.

Uns anos depois, e num processo que começou com a chegada do Valdo, o SLB foi perdendo a sua Cultura. E, especialmente, desde o reinado do Artur Jorge, iniciou-se um longo, lento e extremamente doloroso 7 a 1. Um jogo de milhares de minutos, em que a única alegria foi o titulo com o Trap (o equivalente ao golo do Wando na goleada original). Anos de ânsia constante por um momento em que se vislumbrasse uma reacção à Benfica.
Ânsia essa que me pareceu acabar. Senti isso, de facto, no jogo com o Porto.

O jogo foi um verdadeiro espectáculo de transpiração, um jogo à Benfica, o primeiro de anos e anos e anos, com uma equipa de contingência mas com uma capacidade de superação digna da História do SLB.

E no jogo seguinte, uma vitória difícil, mas com uma atitude pragmática, sem aquele folclore das goleadas, e do bailinho, que não tem nada a ver com a nossa Cultura.
Pois é. Passados quase 25 anos começo a sentir aquela mística outra vez. E a fé nestes rapazes, na sua capacidade para terminarem com este longo e doloroso 7 a 1.

SLB, 1 - Porto, 0
Rio Aves, 0 - SLB, 1

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