Se os conhecidos do OSP lhe têm demasiado respei… lhe têm demasiado medo para serem absolutamente sinceros com o OSP, já os amigos do OSP lhe perguntam amiúde por que é que o OSP, não tendo assim jeito por aí além para jogar à bola (a despeito de ter um brio, uma capacidade de luta e um espírito de sacrifício do tamanho do perímetro de cintura do José Carlos Malato, tudo qualidades intangíveis que, como é óbvio, mais do que compensam a incapacidade do OSP para passar pela maioria dos adversários, não importa o quão imóveis), acha sempre que sabe melhor do que ninguém o que mais convém à equipa de futebol do SLB. A resposta do OSP, diga-se, é invariavelmente “sim”.
É que a realidade é mesmo essa: o OSP sabe melhor do que ninguém o que mais convém à equipa de futebol do SLB, pois reflectiu e reflecte sobre qual é de facto a índole do futebol do SLB melhor do que qualquer thinktank benfiquista, mesmo que aparecesse um composto pelo António Manuel Ribeiro, o Gaspar Ramos, o Manuel Damásio, o Bruno Carvalho e a epiglote do João Malheiro, todos eles eminentes pensadores do clube, sem qualquer dúvida. O OSP arriscaria mesmo dizer que, neste particular, só se genuflecteria perante um thinktank que incluísse o Toni e o Rui Costa, no caso do primeiro por razões nostálgicas e de gratidão afectiva (se bem que, antes de genuflectir, o OSP tivesse de clarificar ao Toni o que quer dizer “thinktank”), no do segundo porque, se o Rui Costa assim o desejasse, o OSP dar-lhe-ia autorização para passar a ser ele a administrar toda a vida privada do OSP, do preenchimento do modelo 3 do IRS aos contactos telefónicos com o serviço de internet da ZON Multimédia, passando pela satisfação parcial dos deveres conjugais do OSP. O Rui merece tudo.
Ele sabe muito bem, afinal, o que é o SLB, porque, conhecendo-o por dentro como poucos, esteve mais de uma década a estudá-lo de fora, a vê-lo de outras perspectivas, pelo que o OSP só espera que os benfiquistas continuem a ser a sua muralha de aço, independentemente do falhanço que esta época vai ser. Do que o OSP tem certeza é que o Rui Costa vai aprender com os erros que cometeu este ano, mesmo não sendo ele o maior responsável por tudo o que de mau aconteceu. Ao escrever isto, o OSP está convenientemente a ignorar a escolha do Quique Flores, da responsabilidade do Rui Costa, mas, como ele, também o OSP foi iludido pela facúndia e pelo charme gitano do Quique e pela combinação calvície foucaultiana-brinco na orelha esquerda-credibilidade científico-desportiva do treinador do SLB, o Pako Ayestarán. Logo, o Rui tem desculpa.
Já o facto de o OSP não ter assim jeito por aí além para jogar à bola não quer dizer que não saiba o que é o melhor para a equipa de futebol do SLB. O João Pinto também não percebe muito de língua portuguesa e não é por isso que deixa de a usar todos os fins-de-semana no Domingo Desportivo. (O OSP promete ainda investigar a fundo quem é o escritor-fantasma responsável pelas crónicas do João Pinto em O Jogo, pois a dificuldade que ele revela em usar a estrutura SVO na televisão não é perceptível aquando da leitura da sua palavra escrita.) Mas isso não é tudo: ao ouvi-lo, bem como quando ouve muitos outros dos chamados “homens do futebol”, o OSP pensa também por vezes que ter jogado bem à bola pode muito bem valer zero na hora de pensar sobre bola.
Tudo isto é válido, naturalmente, para o Quique, antigo lateral-direito do Real Madrid que teve de chegar quase ao fim da época e de ver o seu avançado preferido lesionar-se com gravidade para perceber que, em Portugal, quando se é treinador do SLB, jogar em 4-4-2 resulta na maior parte das vezes. E atenção que o “2” significa mesmo dois gajos lá à frente, bem destacadinhos, e não um ponta-de-lança e um “falso ponta-de-lança”, essa cruz do futebol português. É por causa de coisas como esta que o OSP fica muitas vezes com a impressão de que percebe mais de bola do que muitos dos tais homens do futebol, neste caso do que um treinador que, a cinco jornadas do fim do campeonato, consegue ter a sua equipa (na qual há, é preciso notá-lo, goste-se ou não deles, jogadores como o Luisão, o Katsouranis, o Reyes, o Aimar, o Di María, o Suazo e o Cardozo) a quatro pontos de uma equipa que levou 12-1 nos oitavos-de-final de uma competição europeia.
Os homens do futebol dizem muitas vezes que o tempo dos dois avançados já terminou, que um sistema que os inclua não é moderno que chegue, que está longe da sofisticação do maquinal 4-2-3-1 do Mourinho, que já não passa de uma reminiscência de um passado romântico, mas o OSP mantém que, em Portugal, adoptá-lo na maioria do tempo é ainda e sempre a melhor opção. Ao fim e ao cabo, e tomando o jogo com o Setúbal como exemplo, vale sempre a pena lembrar que 80% dos jogos internos do SLB são com equipas como o Setúbal, se bem que, na maior parte das vezes, com jogadores mais bem-nutridos do que os do Setúbal. No campeonato, e o OSP deixa isto à consideração do Rui Costa, devia haver um regulamento interno que proibisse um treinador do SLB de ir jogar à Trofa em 4-2-3-1. E por favor não venham falar ao OSP dessa treta do “hoje em dia não há jogos fáceis”.
Por outro lado, jogar com dois avançados é quase uma obrigação de qualquer treinador que queira ser parte da tradição do SLB, pois não só traz resultados, como demonstra preocupação em honrar o passado do clube: José Torres-Eusébio, Artur Jorge-Vítor Baptista, Filipovic-Nené, Magnusson-Rui Águas ou Hassan-Marcelo são nomes de integrantes de duplas de ataque que qualquer benfiquista que se preze deve ter na ponta da língua ao invocar as virtudes do 4-4-2, e o OSP tem-nos. Sempre.
O OSP está ciente, claro, de que a concepção romântica que tem do 4-4-2 está directamente ligada ao facto de, nos anos em que começou a ver futebol, ser norma o SLB jogar com dois avançados. Está ainda ciente de que as visões do que ficou para trás são sempre sedutoras e apelativas, porque a tendência humana, afinal de contas, é olhar para o mundo do passado como sendo mais autêntico e menos complexo, mas continua a achar que, em 1986 como agora, os Setúbais e os Trofenses compõem a maior parte dos adversários do SLB no campeonato, além de o SLB ter sempre, regra geral, melhores jogadores do que essas equipas. É, pois, uma simples questão de números, tão simples que até o OSP a percebe, mesmo sendo um homem das letras.
O OSP pode não ter assim jeito por aí além para jogar à bola, mas isso não o impede de saber que o Balboa não joga um caralho. Do mesmo modo, não precisa de grandes explicações para demonstrar que jogar com dois avançados é eficaz. O jogo com o Setúbal faz isso pelo OSP, já que foi precisamente o facto de o SLB ter jogado com dois avançados que levou a uma vitória tão larga (cada um desses avançados, já agora, marcou dois golos).
Para ser fiel à verdade, O OSP é forçado a admitir, contudo, que a defesa do Setúbal se mostrou escandalosamente inepta, mas o facto é que teve sempre dificuldades em entender-se com dois jogadores do SLB na frente. (O OSP tem certeza absoluta de que tal se ficou a dever à ausência por lesão de uma velha paixão sua, o Zoro: tivesse ele jogado, o Setúbal não precisaria de outro central ao lado dele, pois o Zoro marcaria o Nuno Gomes e o Cardozo em simultâneo e ainda teria tempo para ir à área do SLB criar perigo em cada lance de bola parada que houvesse.) E o melhor exemplo disso é a jogada do 4-0: o Di María cruzou, ficaram três defesas a olhar para o Cardozo, e o Nuno Gomes teve tanto tempo para rematar que até ele teria dificuldade em não marcar. Mesmo assim, demonstrando um toque de bola quase obrigadosápíntico, ainda conseguiu rematar para o meio da baliza, praticamente à figura.
Setúbal, 0 - SLB, 4