26.8.08
A tradição ainda é o que era
A equipa vestida com o uniforme dos residentes do linhó põe em campo um bando de putos que joga bem à bola e ganha a equipas vindas da Trofa, Sarilhos Grandes ou Gáfete.
O glorioso joga malzito, empata com equipas que foram esmagadas pelo Gafetense, e os jogadores parecem as baratas de Beni-Melal. Tontas e a importunar o Tó Portela.
Dirija Santos, Koeman ou Quique, organize Iliev, Rui Costa ou Aimar, tente marcar Pringle, Nuno Gomes ou Cardoso, A Angústia do Benfiquista Antes da Primeira Jornada apenas se compara com A Angústia do Benfiquista Depois da Primeira Jornada.
Nem tudo foi mau, o Quique, ainda pouco habituado às tradições portuguesas, ignorou o árbitro, a equipa jogou malzito mas não horrivelmente e o Nuno Gomes marcou o seu golo anual.
Se as coisas continuam assim ainda ficamos acima do 4º lugar.
Mau, querem ver que o espanhol ainda nos deixa mal habituados!?
13.8.08
O Obrigadojoãopinto deseja anunciar:
Três semanas e meia ausente, tanto que se perde, porque o devir benfiquista é ininterrupto. Contudo, há no OSP perspicácia pós-estival suficiente para apregoar que, como um homem que se passeia de sobretudo pelo jardim do Campo Grande em pleno mês de Agosto, o OSP pretende escrever sobre o abandono do João Pinto de forma escandalosamente exibicionista, no caso mostrando o seu conhecimento enciclopédico dos Cahiers du Cinéma. Afinal, só alguém com tal erudição ousaria relacionar o Godard e o João Pinto – e o OSP vai fazê-lo. Afinal, como o professor Von Braun lembra no Alphaville, é possível alguém tornar-se algo pior do que morto, que é alguém tornar-se uma lenda.
Dias tristes para o OSP eram quando o João Pinto, o Menino de Ouro – que é de facto o que ele foi para o OSP e para muitos benfiquistas decentes e com memória –, voltava ao Estádio da Luz e era assobiado, enxovalhado, odiado, como se de um qualquer Vale e Azevedo se tratasse. Isso faria algum sentido, supõe o OSP, quando o João Pinto jogava no Sporting, por razões históricas e essas cenas, mas tornou-se uma infâmia, quando ele veio jogar à Luz pelo Boavista e pelo Braga.
À geração do OSP, o João Pinto proporcionou a melhor exibição de um jogador de futebol que ela já viu (e verá – o OSP crê que se pode dizer isso, também, com toda a presciência) na sua vida. Para quem daqui a muitas décadas leia sobre esse jogo ou veja as imagens do mesmo, o que o João Pinto fez naquela tarde de chuva parecerá uma coisa, mais do que inacreditável, absolutamente irreal, o equivalente ao que hoje se sente quando se vêem imagens de um jogo do princípio do século XX. Naquele dia em que marcou três golos, qual deles o melhor, e deu dois a marcar, o João Pinto transcendeu a arte que então praticava e tornou-se parte, durante 79 minutos, de uma realidade que a maior parte das pessoas nunca conseguirá habitar.
Como o Bacon no estudo sobre o Inocêncio X (ou, para usar um exemplo lowbrow próximo, como o Neo no fim do primeiro Matrix), o João Pinto levantou o véu da maya, conseguiu ver o jogo de futebol para além do aparente. O OSP aposta que, nesse dia, pareceria ao João Pinto que todos os jogadores adversários jogavam, de facto, de tamancos. Foi uma actuação inesquecível, superior, e não apenas para benfiquistas, mas para todos os que gostam realmente de futebol. Estes últimos dirão até morrerem que, na década de 1990, tudo o que era preciso para haver um jogo de futebol em Portugal era o João Pinto e uma bola.
E, nessa breve viagem de impossível repetição, daí o carácter trágico que acabou por assumir a carreira dele no SLB, o João Pinto levou consigo, durante 79 minutos, milhões de benfiquistas, alguns dos quais o terão assobiado, quando ele voltou à Luz vestido de outra cor. Só que quem o fez não se lembrou de que ele não saiu porque quis; não se lembrou da dor que sentiu quando ele, poucas semanas depois de ser corrido do SLB, marcou aquele golo de cabeça à Inglaterra; não se lembrou de que ele foi corrido para o Heynckes ficar; não se lembrou do comunicado que ele foi forçado a ler a seguir a Vigo; não se lembrou de todos aqueles anos a fazer dupla no ataque com o Hassan e o Marcelo e o Mauro Airez e o Cadete e o Pringle; e não se lembrou de que, em meio à Idade das Trevas do futebol português e num SLB desacreditado, ele, que era tantas vezes o único jogador relevante na equipa, levou, à frente de árbitros eminentemente contemplativos, mais porrada do que qualquer outro jogador em toda a história do futebol.
Para o OSP, não há nada mais importante do que a memória, e é por isso que lembrará sempre, mesmo que não o queiram ouvir (o que é mais frequente do que possa parecer, incrivelmente), o grande serviço que o João Pinto prestou ao SLB. Ele era a verdade, e era-o várias vezes por jogo. Inebriado agora pelo mais poderoso dos narcóticos, a sensação de superioridade moral, o OSP censura os benfiquistas que esqueceram tudo isso, contudo mostra-se aberto a reconhecer que o facto de o João Pinto ter andado aos pulos com a Juve Leo, a cantar o “E quem não salta é lampião”, logo na porra do dia em que foi apresentado em Alvalade é bem capaz de ter contribuído para a diminuição da força da paixão wertheriana expressa nos quatro parágrafos anteriores.
12.8.08
Eu vou continuar a comer aqui o meu peixinho
Três semanas e meia ausente, tanto que se perde, porque o devir benfiquista é ininterrupto. Contudo, há no OSP perspicácia pós-estival suficiente para o OSP admitir, até ao âmago dos seus terminais nervosos, que as entrevistas televisivas do Luís Filipe Vieira são, na verdade, excruciantes e quase insuportáveis comédias de embaraço, que superam tudo o que o Ricky Gervais alguma vez conseguiu sequer imaginar. E o facto de, a meio de Julho, a Judite de Sousa o ter convidado para uma conversa a dois no ambiente intimista da Grande Entrevista (ao OSP, parece que o Vieira se sentiria mais à vontade se se visse envolto pelo ambiente semitaberneiro que só uma Fátima Campos Ferreira consegue gerar) não é mais do que a prova de que o Fernando Seara está a arquitectar um sórdido plano secreto para vir a ser presidente do SLB.
Seja como for, houve, contudo, uma pérola no meio daqueles três quartos de hora de entrevista (que, se fossem um som, seriam a mistura do guincho de uma chave de fendas enferrujada a riscar um quadro negro e do silvo de uma rebarbadora a raspar numa placa de alumínio) que permitiu que o OSP ficasse a saber, e se sentisse confiante para o anunciar desde já (em primeira mão e tudo), que o Vieira vai ser o segundo maior escritor português da era Gonçalo M. Tavares. É um conhecido adágio literário, afinal, que a história é escrita pelos vencedores, e a literatura, pelos perdedores. Ora, tomando isto em consideração, se o Vieira nunca vier a ser julgado pela história como um vencedor enquanto presidente do SLB, ao menos o OSP vai comprar, sozinho, toda a primeira tiragem da sua autobiografia, quando ele honrar o País com a sua publicação.
Afinal, um homem que é capaz de dizer o que o Vieira disse viu ao que respondem as engrenagens da máquina do destino humano – percebeu algo sobre a natureza das coisas, sobre as pulsões do homem e do mundo, o homo homini lupus em que se sustenta a ilusão chamada sociedade, que o revela como tendo um olhar clínico e frio sobre a realidade que decerto o qualificará como futuro grande romancista. Talvez o naturalista que a literatura portuguesa nunca teve verdadeiramente, à imagem de um Zola, porém pós-moderno, como é óbvio.
E o que disse Vieira? Disse Vieira: "Para ter razão em Portugal, temos de ganhar." Touché, caro presidente, touché. E se é verdade que a verdade de Vieira (e o que é a literatura senão a busca de uma verdade?) não se limita ao que acontece em Portugal, o OSP tem absoluta certeza de que, daqui por 30 anos, as obras do Vieira tardio não deixarão de espelhar isso mesmo.
10.8.08
E se de repente o mercado lhe oferecesse flores?
Três semanas e meia ausente, tanto que se perde, porque o devir benfiquista é ininterrupto. Contudo, há no OSP perspicácia pós-estival suficiente para perceber que duas das coisas mais importantes que aconteceram entretanto foram as contratações do Aimar e do Reyes. E, só pela visão que ambas revelam, o Rui Costa está prestes a demonstrar que ainda agora começou e já é o Michael Phelps do dirigismo desportivo português (e não pelas razões que o vulgo costuma associar ao Phelps). Pouco importa se o Aimar vem para cá cheio de caruncho e se contratar o Reyes implica contratar também, ao que parece, toda a família do gajo, porque o que o Rui Costa fez foi confirmar que é, pelo menos, um vendedor de futuros (tal qual o Phelps). E pouco importa que, no fim de tudo, o Rui Costa se venha, afinal, a revelar como mero vendedor de ilusões (a confirmar, tal qual o Phelps), porque o que ele fez foi provar uma vez mais que é, ao mesmo tempo, gerador e parte do inconsciente colectivo benfiquista, cujo excesso absoluto e por vezes grotesco compreende como ninguém.
Pelo menos o OSP já está cheio de vontade de ir à Luz só para ver o Aimar e o Reyes, e imagina que assim estarão todos os benfiquistas. A expectativa em relação a mais este começo, à dor de mais este renascer, tornou-se, como uma coxa trabalhada pelo Pako Ayestarán, eminentemente palpável. E é isso que o Rui Costa está a anunciar aos benfiquistas – se bem que por outras palavras, como é natural. Desta vez, contudo, é importante notar que não se trata de uma expectativa como a do ano passado em relação ao Adu, que chegou cá coberto de hype sobretudo por ser o melhor e mais regular jogador da história do Championship Manager, ou como a de há sete anos em relação ao Zahovic, então o ápex absoluto da equipa-maravilha (o OSP sente-se compelido a confessar que experimentou um não-tão-pequeno-quanto-isso episódio de refluxo gastroesofágico ao escrever sobre o Zahovic); não, desta vez o Aimar vem como antigo titular da selecção argentina, como antigo 10 da selecção argentina, e o Reyes como um gajo por quem o Wenger, um conhecido forreta com algum jeito para ver talento futebolístico jovem, pagou 35 milhões de euros, quando ele tinha 21 anos.
Depois de tudo o que leu e ouviu, contudo, o OSP 1) espera agora que acabem, antes de irem mais longe, as comparações entre o Aimar e o Rui Costa, já que o Aimar é um jogador de último terço, e pura e simplesmente nem parece ao OSP que tenha força para fazer um passe longo à Rui Costa (aliás, é melhor nem o tentar, porque, com o físico que o Aimar tem, decerto a rotura muscular espreita, ansiosa, a toda a hora); 2) e jubila por aquele remate ao poste do Reyes, com o Feyenoord, a primeira vez que ele tocou na bola como jogador do SLB, não ter entrado, porque se teria tornado algo que ele nunca poderia superar, e o notoriamente irracional Terceiro Anel jamais se aperceberia disto e ficaria para sempre insatisfeito com tudo o que ele viesse a fazer daqui em diante. (Por outro lado, até porque veio de um cruzamento perfeito do tão injustiçado Makukula, o OSP tem de admitir que teria sido o melhor golo da história do novo Estádio da Luz. Como é que a merda da bola não entrou...?)
Todas as acções do Rui Costa no mercado têm sido, excepto o arrastar do interesse no Luis García, mas incluindo a dignidade mantida no caso do Rodríguez (e sim, até o ele ter despachado o Petit, como qualquer pessoa que tenha visto a época passada e o Europeu com olhos de ver terá de admitir), passe genial atrás de passe genial, além de que parece haver petróleo na Luz, com tanta contratação na última época (três milhões pelo Maxi fucking Pereira?!?) e nesta. (E o OSP divaga sobre quão melhor tudo poderá ser, quando finalmente acabar o contrato com a Olivedesportos, e treme de gozo só de pensar…) No fundo, confirma-se, como o OSP já disse mais do que uma vezzzzzzzzzz… que tudo que o Rui Costa fazia enquanto jogador era apenas sinal de uma natureza elevada, de uma inteligência então feita cinética, no campo, hodiernamente feita sagacidade e paciência, no gabinete.
E, se o jogador de futebol normal está muito abaixo do que ele era enquanto jogador, o Rui Costa não fica ressentido com isso, nem busca por Espanha pelo mundo apenas jogadores que sejam geniais, como ele foi. Não, o que ele faz é mostrar que descobriu qual o segredo das equipas de sucesso em que jogou (e das que observou de fora, porque o Rui Costa não se pode reduzir ao empírico, é muito mais reflexivo do que isso). Não se trata de fazer equipas-maravilhas ano após ano, trata-se apenas de ter, numa equipa, três ou quatro foras-de-série, e arranjar oito ou sete tipos para olharem por eles. Pela primeira vez em década e meia, parece haver um plano para o SLB, percebe-se que há ali uma ideia. E, no fim de contas, é sempre daí que tudo parte (tal como com o Phelps).
O Rúben Amorim, o Yebda, o Jorge Ribeiro, o Balboa, o Sidnei, o Fellipe Bastos – parecem sólidos, e é só isso que é necessário. Agora protejam o Aimar, o Di María, o Carlos Martins e o Reyes. E, se necessário, podem fazê-lo obrigadosápinticamente, ou seja, com excesso de agressividade.